Em um estúdio em North London bem perto de um enorme cemitério, Rita Ora está nua no set de sua capa da Clash. Sua publicista veio para a cozinha do estúdio para nos informar que até que Rita e o fotógrafo fiquem felizes com as fotos, iremos ficar aguardando.

Numa sala improvisada atrás do set tem várias etiquetas e coisas que, pela última hora, a cantora tem se enfiado. Até o momento ela usou couro, botas plataforma, saltos tão altos que poderiam machucar não apenas a ela mesma mas as pessoas ao redor, e agora o momento da nudez. Uma vez que recebemos permissão para deixar nossa quarentena, Rita já está em seu próximo look, uma capa que poderia ter saído do período de Elizabeth se não fosse o fato de que é literalmente feita de alumínio, e tendo mais fotos sendo tiradas. De repetente, e em uma onda de mais papel alumínio, ela emerge, uma grande criança sorridente.

“Sempre estive vestindo roupas doidas”, ela diz duas horas antes. Estamos sentadas na sala que abriga todas as roupas enquanto Rita se prepara para as fotos. É uma sessão de glamour que começou com a cantora tendo suas sobrancelhas descoloridas e seu cabelo ficando com um tom molhado fashionista. “As pessoas pensam que não podem vestir essas coisas”, ela continua, olhando as araras de roupas atrás de mim, “e eu tenho essa coisa em mim que é aonde eu tenho que mostrar às pessoas que eu posso usá-las”.

Determinação está no DNA de Rita Ora. Após assinar um contrato com a Roc Nation de Jay Z aos 18 anos, ela lançou seu álbum de estreia “ORA” no Reino Unido em 2012, com 21 anos. O álbum foi um hit, alcançou a platina e rendeu três singles #1. Continuando esse momento ela lançou outro single número #1, ‘I Will Never Let You Down’, uma música produzida por seu então namorado Calvin Harris, em 2014, como o primeiro single do seu segundo álbum. Então, ela ficou presa musicalmente.

Depois que seu relacionamento chegou a um fim, Calvin tirou suas músicas do álbum de Rita, baniu-a de performar seu single #1 e essencialmente cortou a campanha de seu álbum. Um ano depois, falhando na tentativa de lançar alguma música de impacto nos Estados Unidos, incluindo seu álbum de estreia, e depois de alguns singles inexpressivos, Rita entrou com ação legal contra a Roc Nation, acusando a gravadora de deixá-la “órfã” após trocarem de parceiros de distribuição da Sony para a Universal mas deixando Rita na Sony. “Rita,” dizia o documento, “está presa numa disfunção política pragmática”, com ninguém na Sony, Universal ou Roc Nation, lutando ao lado dela.

Incapaz de lançar música, Rita voltou seus olhos e talentos para outros horizontes. Se tornou uma jurada no The Voice UK, apresentou o America’s Next Top Model, estrelou em todos os filmes da trilogia Cinquenta Tons, assinou contratos com grandes marcas da moda, trabalhou com Madonna em sua linha da Material Girl, dentre outros projetos criativos. Nos Estados Unidos, Rita Ora se tornou uma marca, sua música foi para o banco de trás enquanto ela lutava para manter seu nome em evidência.

“Estou numa situação peculiar, realmente específica”, ela explica, “aonde eu acho que criei minha marca (nos Estados Unidos) antes de eu deixar a música falar por si só, porque era a única liberdade que eu tive aonde eu estava com o contrato naquele momento. Eu só acho que seria melhor fazer isso do que desaparecer por completo. Eu não queria fazer isso”.

Rita menciona um discurso que Jennifer Lopez deu no VMA deste ano aonde ela falou sobre como as pessoas no começo de sua carreira diziam para ela que ela só poderia fazer apenas uma coisa. “Ela nunca entendeu e eu me vi nessa situação porque eu sinto o mesmo”, Rita adiciona. “Eu tenho muita fé em poder criar uma marca e um negócio, ser esperta e ter um plano. Não quero colocar tudo a perder sabe?”.

Essa ambição não diminuiu o impacto emocional que o bloqueio musical causou. “Foi muito difícil para mim. Teve momentos que…”, ela para e respira fundo. “Eu estava tipo, eu posso fazer isso? Eu posso fazer isso? Eu tive que lutar por isso. Sou humana e foi muito difícil. Tiveram muitos altos e baixos”. Os altos vieram na forma de apoio da indústria. “Eu realmente aprendi que a indústria é maior do que você pensa. Tem muitas oportunidades aonde você pode estar no controle”.

Controle, pelo que parece, era algo que estava sempre faltando na jornada musical de Rita. Quando eu sugiro que seu primeiro álbum, com suas músicas de festa e sem grandes riscos, foi meio que organizado por uma equipe ao invés de nascer de forma orgânica, ela não discorda. “Um pouco”, ela diz. “Havia muita pressão”. Ela também reconhece que sua imagem pública, ou pelo menos a percepção dela, e o interesse dos tabloides na sua vida amorosa está além de sua jurisdição, apesar de que ela não vê o escrutínio e as fofocas com qualquer negatividade. “Acho que é algo que vem com coisas boas e coisas ruins, mas é melhor do que ninguém dar a mínima pra você”.

Enquanto construir uma marca e se manter ativa criativamente era importante, ganhar autonomia sobre sua carreira musical era o objetivo final de Rita Ora. E quando as coisas chegaram a uma suave conclusão quando, em 2016, ela acertou seu processo (e o subsequente contra-processo) com a Roc Nation. Livre de seu contrato, ela assinou um contrato com a Atlantic Records, casa de nomes como Ed Sheeran, Clean Bandit e Charli XCX. Por um ano ela finalizou suas obrigações e foi direto para o estúdio. Pela primeira vez em toda a sua carreira, as ideias de Rita foram recebidas com uma total autoridade criativa e pelos dois últimos anos, ela tem cozinhado um retorno.

Agora, seis anos depois que seu álbum de estreia foi lançado, Rita Ora tem se preparado para o lançamento de seu segundo álbum, intitulado ‘Phoenix’, neste outono. Precedendo o álbum tiveram quatro singles top 10 (um grande feito numa era ditada pelos streams) incluindo ‘Your Song’ escrita por Ed Sheeran, ‘Anywhere’ com suas vibes de ABBA, ‘Lonely Together’ – uma colaboração com Avicii e a última música do DJ antes de sua inesperada morte esse ano – e finalmente ‘For You’, um dueto com Liam Payne. A gravação do álbum foi algo que ela nunca havia experienciado antes. “Era como estar em uma loja de doces”, ela brinca. “[A gravadora] me perguntou, ‘Rita, o que você quer fazer?’. Eu nunca havia sido perguntada sobre isso antes e eu queria fazer tudo. Trabalhei com tantas pessoas incríveis e eu acabei escrevendo músicas com pessoas que se tornaram muito importantes na minha vida. Criei relacionamentos incríveis e sou grata porque agora eu tenho uma família musical”.

Os singles são uma boa indicativa da identidade sonora do álbum. De uma maneira que ‘Anywhere’ foi delicada, simples e meio que esperançosa, as cinco músicas que a Clash ouviu são abertas, mais amplas e com um foco emocional muito maior do que qualquer coisa que esteve no “Ora”.‘Let You Love Me’, que é um dos próximos singles, é uma auto análise sobre os escapes emocionais de Rita, aonde ela mostra vulnerabilidade com sua cara crua sanduichada entre sintetizadores fortes e produção minimalista. Em ‘Cashmere’, uma umida e suja faixa sobre sexo, Rita mostra anotações de Fifty Shades quando ela canta, “Caxemira / Noite passada fizemos uma bagunça / Eu soube quando fui embora / Eu veria você novamente” em cima de um baixo no estilo de The Weeknd. Liricamente também as músicas são executadas com confiança. Em ‘Only Want You’, uma música de amor recebida com batidas e violão, é afogada em desespero e tem a frase brilhante: “Não quero outra noite de tentar encontrar outro você, outro fundo do poço / Não quero vestir outro mini-vestido tentando impressionar um problema potencial”.

A anomalia entre os singles lançados nos últimos 12 meses é ‘Girls’, uma colaboração com Charli XCX, Bebe Rexha e Cardi B. Com a frase “As vezes eu só quero beixar meninas / Vinho vermelho, só quero beijar garotas”, a música foi recebida com críticas imediatas. Popstar lésbica, Hayley Kiyoko falou que a música tem um tom insensível, acusando Rita e suas colaboradoras de aumentar “o olhar masculino enquanto marginaliza a ideia de mulheres amando outras mulheres”, e Kehlani, que se identifica como queer, falou que a letra da música “machuca”. Então vieram as opiniões nas mídias sociais e artigos de opinião, cada um deles destacando os “esterótipos retrógrados” da música.

O que muitos falharam em levar em consideração foram os versos na primeira parte da música aonde Rita declara “não tenho um lado, tenho mente aberta, sou meio a meio e nunca vou esconder”. Além disso, teve o relacionamento de Rita com a modelo e atriz Cara Delevingne, que Rita recusou a classificar como estritamente platônico. A cantora divulgou uma declaração aonde ela explicou que enquanto ela teve relacionamentos românticos com homens e mulheres, ela se desculpava caso “maneira pela qual eu me expressei tenha machucado alguém”.

No entanto, quando eu pergunto sobre o incidente agora, Rita, como o escrutínio dos tabloides, fala com mais força. “É um tempo diferente, é uma era diferente e nós temos opiniões diferentes. Todos tem um direito de se manifestar e eu também o fiz. Segui minha intuição e meus instintos. No final do dia, pessoas podem dizer o que quiser mas sou eu”. Ela não se sentiu pressionada? “Não”, ela rebate, “porque com tudo isso eu ainda tinha muita positividade, especialmente da comunidade LGBTQ. Eles me apoiaram e ficaram do meu lado. Sinto que essa experiência nos aproximou”.

Sugiro que, de qualquer forma, ainda é injusto que ela tenha que se explicar de uma maneira quando ela estava apenas expressando uma emoção real, mas que certos artistas masculinos podem atacar a comunidade LGBTQ e nunca tem que se explicar. “É injusto”, ela concorda. “Eu tinha uma vontade, sabe, de chacoalhar as coisas um pouco. Senti tipo, porque eu não posso falar a minha verdade?”.

Continuando, ela adiciona: “Não vou fazer isso sobre minha sexualidade ou meu gênero. Isso vai nos fazer voltar a tempos antigos. É uma nova era. É 2018. Não acho que é sobre gênero. Acho que as pessoas estão apenas se acostumando a ver outras serem mente aberta e falando livremente. É isso. E eles vão ter que entender e superar”.

A Rita Ora de 2018 é capaz de varrer essas coisas pra fora e minimiza o drama. É poque no ano passado ela encontrou perspectiva. 12 meses atrás ela disse que sentia “desapreciada” como música. Agora, depois de uma turnê esgotada, numerosos top 10 e uma série de mais de 30 datas em festivais, ela achou seu chão. “Como um ser humano, você sempre sente que pode fazer mais”, ela diz honestamente. “Mas meus fãs são realmente especiais. Eles fazem eu me sentir bem. São esses níveis de apreciação que ficam na sua cabeça”.

E sobre a moda de outro mundo, especulações sobre sua carreira ou basicamente qualquer outra forma de negatividade, tudo o que Rita se importa é “representar a mim mesma, meus fãs, continuar real à mim mesma, ser uma boa pessoa”. Ela conta sobre como tem trabalhado com a Unicef em construir um centro de artes criativas no seu país natal Kosovo “para permitir que os sonhos criativos das pessoas se tornem realidade”. Seus olhos ficam brilhantes quando falamos sobre como de alguma forma ela cantou na canonização de Madre Teresa (“Não consigo acreditar que eu fiz isso. Foi no Vaticano. Mudou a minha vida. Não conseguia acreditar que era eu!”). Mas o que ela mais se orgulha é que ela tem colhido grandes frutos de algo que poderia ter sido uma situação que acabaria com sua carreira. “Tenho muito orgulho em dizer isso. O trabalho foi real”.

O que, então, sucesso significa para ela após tudo o que ela passou? “Quando você alcança algo que você considera como objetivo, você espera que ao chegar lá, sua via vai estar completa. Você alcança, você está tão feliz, mas então você não quer que isso acabe”, ela diz. “Sinto que eu estou apenas começando, de uma maneira mais estranha possível”. Conheço pessoas nessa indústria que eu não vou nomear, mas me mandaram mensagens dizendo ‘Você é uma durona por ter feito o que você fez’. Alcancei um novo respeito. Agora no entanto é hora de botar isso de lado e manter esse capítulo seguindo em frente”.

Como eu disse, determinação: está no DNA de Rita Ora.